quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Promessa de fim de ano. Em 2012, vou ler.....


Normalmente no final do ano, a gente promete mudar radicalmente a vida. Os planos são incontáveis, embora nem sempre consigamos segui-los à risca,  a começar pelo regime que sempre acaba no primeiro bolo de chocolate ou naquela inofensiva cervejinha de janeiro. Metas à parte, nossos desejos fazem parte de um sonho. Sem eles, a vida seria bem mais difícil e a nossa realidade não seria transformada. Em 2012, viverei um dia de cada vez, este é o princípio adotado!

Na minha pequena listinha de coisas, está a leitura de alguns livros e autores; muitos deles foram indicações de amigos. No decorrer das leituras vou tecendo por aqui meus comentários.

Feliz ano novo! Happy New Year! Joyeux Nouvelle Année! 

Livros para ler em 2012:

Nêmesis, A Marca Humana e Complexo de Portnoy (este, acabei de começar) - Philip Roth
As Teorias Selvagens - Pola Oloixarac
A elegância do Ouriço - Muriel Barbery
Austerlitz - Winfried Georg Maximilian Sebald
2666 - Roberto Bolaño
Neve e Romancista Ingênuo e o Sentimental- Orhan Pamuk
A máquina de fazer espanhóisValter Hugo Mãe
Beatriz e O Filho Eterno – Cristovão Tezza
O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio- Charles Bukowski
Minhas Mulheres e Meus Homens -  Mário Prata
Memória de Elefante - António Lobo Antunes
A Trégua e Primavera Num Espelho Partido - de Mario Benedetti
O Vendedor de Passados – José Eduardo Agualusa
A arte de escrever - Arthur Schopenhauer
Água Viva – Clarice Lispector
Angústia – Graciliano Ramos
Travessuras da Menina Má - Mário Vargas Llosa
Carta ao Pai – Franz Kafka
A Solidão dos Números Primos – Paolo Giordano
A Trilogia de Nova Iorque - Paul Auster
Vento Sul - Vilma Áreas
Apontamentos de Viagem - Joaquim de Almeida Leite Moraes
Os Verbos Auxiliares do Coração - Péter Esterházy
História do Cabelo - Alan Pauls
Dois Rios - Tatiana Salem Levy
Meus Prêmios - Thomas Bernhard
Uma Duas - Eliane Brum
Seria uma Sombria Noite Secreta - Raimundo Carrero

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O jardim de inverno de Henri Salvador



Um dos artistas mais elegantes de todos os tempos é, sem dúvida, Henri Salvador. O cantor e compositor nascido na Guiana Francesa, e falecido em 2008 aos 90 anos, tinha uma ligação forte com o Brasil, tanto que seu último álbum foi gravado e finalizado em terras tupiniquins, dois anos antes da sua morte. Para seu derradeiro trabalho, convidou o violoncelista mais  requisitado pelos mestres da MPB, Jacques Morelenbaum, para fazer os arranjos do disco.

Em mais de 60 anos de carreira, Salvador cantou com muitos nomes importantes da música mundial, inclusive com brasileiros como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Rosa Passos. De estilo personalíssimo, a música dele é uma mescla de chanson française e jazz. Aliás, dizem que ele foi a maior influência de Tom Jobim para criar a bossa nova no final dos anos 50. Reza a lenda que isso se deu após o Maestro Soberano ter escutado, através de um filme italiano, a canção Dans mon Ilê, também gravada por Caetano.

Dentre tantos sucessos, destaco algumas Tu Sais Je Vais T'aimer, Jardin d'hiver, Aime-moi, e Jazz Méditerranée.

Uma curiosidade que poucos sabem é que Henri colaborou em dois filmes da Disney. Na versão francesa, o simpático camarão Sebastian, da Pequena Sereia, ganhou a voz dele, que também fez uma versão para o Rei Leão.

A música Jardin d´hiver é tudo de bom, para escutar sem parar. Amo!

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Louise Bourgeois e Almodóvar. Uma combinação perfeita!

Obra de Louise Bourgeois 


Almodóvar é tão genial, mas tão genial (o espanhol é um artista no sentido mais literal do termo; seus filmes são pura plástica, verdadeiras obras de arte!), que logo nas primeiras cenas do filme A Pele que Habito, ele se utiliza do nome de Louise Bourgeois e todo o simbolismo que nele implica para sinalizar do que vai falar: corpo. A metáfora utilizada pelo cineasta é simplesmente brilhante. A Pele que Habito explora a questão de gênero relacionada com o desejo.  Uma obra-prima!

Assim como no filme, Louise Bourgeois ficou famosa por explorar os limites do corpo, não só física como psicologicamente. Vestida com uma pele bege, desenhada por ninguém menos que Jean-Paul Gaultier, a personagem de Almodóvar dá vida ao trabalho de Louise, também conhecida como mulher-aranha. Em Bourgeois, o confronto com o aspecto obsessivo do corpo no seu trabalho emociona quando não choca.

O que dizer além do que já foi dito sobre Louise Bourgeois? Uma mulher que esperou até os setenta anos para se tornar uma das figuras mais proeminentes dos últimos tempos, com obras de arte espalhadas nos maiores e mais importantes museus do mundo?  

A primeira obra dela que vi pessoalmente foi justamente a Aranha* (uma das mais emblemáticas), no final dos anos 90, na Bienal de São Paulo. Depois, fui me deparar com uma grandiosa (literalmente) obra dela - a dos jogos dos espelhos - na inauguração da Tate Modern, em Londres. Há três anos, tive o privilégio de ver uma retrospectiva de Louise Bourgeois, no Beaubourg – como é conhecido o Centro Pompidou, em Paris. Deparar-se com Bourgeois é sempre um acontecimento que marca. Simplesmente emocionante! 

O interessante na vida desta artista é que só depois de muitos anos de trabalho discreto que suas formas estranhas (e por que não dizer bizarras?) seduziram e arrebataram os amantes de arte no mundo inteiro. Suas instalações são irônicas e, de certa forma, sombrias! A arte de Bourgeois demonstra uma visão caleidoscópica que a artista tinha da percepção do corpo e da mente.

Nas inúmeras entrevistas que dava, Louise costumava dizer que a ela lhe interessava entender os limites do corpo. Sua busca incessante foi captar o momento em que o sofrimento emocional se tornava em dor física. A artista não hesitou em explorar todos os limites do corpo. Quer desejo mais denso do que este? Mais almodovariano?Ah, este filme marca a volta triunfal de Antonio Banderas ao cinema de Pedro Almodóvar de onde o ator nunca deveria ter se afastado. 

A obra de Louise Bourgeois é de uma dimensão autobiográfica incrível.  Visceral.  Tudo é intenso. Bourgeois manifesta uma consciência profundamente humana (trágica e cruel) da existência, exatamente como no filme de Almodóvar. Sentimentos como medo, proteção, sedução, traição, vulnerabilidade, permeiam esses universos.  Almodóvar reconhece que um de seus personagens é salvo por conta de Bourgeois. Assim como Lolô, corram pra ver o filme!

Louise Bourgeois morreu no ano passado, aos 98 anos, em Nova Iorque, cidade que escolhera para morar havia décadas. Termino com uma célebre frase de Louise Bourgeois que sintetiza bem sua arte: “I have no ego. I am my work”.


* A enorme aranha que fica exposta permanentemente no MAM, em São Paulo, foi batizada por Louise como Maman e representa a mãe da artista – na ambígua metáfora da aranha. A aranha que, a priori, é interpretada como uma figura macabra e traiçoeira.

sábado, 12 de novembro de 2011

A nova cara da música pop francesa!



Uma das coisas mais legais na Aliança Francesa é que a gente fica sempre em dia com o melhor da França. Talvez Bertrand Betsch seja uma descoberta apenas para esta que vos escreve. De qualquer forma, é uma novidade que vale uma postagem. O artista da vez, pelo menos aqui no blog, é esse cantor, compositor e escritor de origem francesa, nascido em 1970.  

Na verdade, Bertrand Betsch surgiu no final dos anos 90, mas não conseguiu sucesso de imediato. Ele só teve uma projeção com o lançamento, em 2004, do álbum Pas de Bras, Pas de Chocolat (livre tradução: Sem braços, nem chocolate) e quando foi finalista, no ano seguinte, do prestigiado Prix Constantin, onde interpretou Tournicotons, deste mesmo trabalho, o que lhe rendeu uma boa notoriedade.  

Depois, ele traçou seu caminho longe dos refletores. Aliás, felizmente Bertrand Betsch é um daqueles artistas considerados sofisticados pela crítica, mas que não são midiáticos. Outra característica que me agradou bastante.

Bertrand tem um estilo meio minimalista, meio sintético que me soou inovador. A melancolia presente no seu trabalho é um traço característico nele que eu adoro. E tem mais, para os aprendizes da língua francesa - como eu -, Bertrand Betsch é perfeito: a sua pronúncia e a entonação de voz são excelentes para o nosso ouvido de aprendiz! Taí uma boa pedida! Quem quiser saber mais sobre o artista, basta ir ao http://www.bertrandbetsch.fr

Ah, ele acabou de lançar Le temps qu’il faut  através do seu próprio selo 3h50. Superbe! 

Clique aqui para ver a música Por une chance

Mas o que eu estou escutando sem parar é esta pequena apresentação do Bertrand Betsch feita ano passado em Lyonhttp://dai.ly/aLjYX7




quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A Morte de Ivan Ilitch: em busca de um sentido para a vida!



Nunca um livro me tocou tanto quanto esta pequena novela de Leon Tolstoi, com pouco mais de 80 páginas. A Morte de Ivan Ilitch foi escrita no final do século XIX, mas é uma obra-prima extremamente contemporânea.  Com uma aguçada densidade, a novela retrata o tema da morte e o sentido da vida, personalizada em Ivan Ilitch, um juiz russo que, diante de uma doença terminal no leito da morte, faz uma profunda reflexão sobre toda a sua vida, revelando-se a si próprio.

O autor subverte a ordem das coisas no título que logo diz a que veio e, em seguida, na narrativa magistral, cuja história começa no velório. O livro é perturbador! Ilitch teme a morte mais do que tudo ao perceber que sua vida poderia ter sido mais proveitosa, honesta e menos fútil. Quanto mais insuportáveis se tornam as suas dores, mais a realidade lhe é exposta de forma crua e nua. E assim, ele percebe o vazio construído ao longo da sua vida.

Família, emprego, amizades. Tudo isso nada mais é do que uma mera ilusão. O ato de morrer carece de algum significado. Para o respeitado juiz, resta apenas o niilismo,  o nada, o vazio existencial. Conforme a leitura se aprofunda, encaramos na morte do personagem o reflexo da nossa própria existência que se esvai gradativamente. Sem dúvida, o livro deveria ser uma leitura obrigatória nos dias de hoje tendo em vista a enorme inversão (quando não ausência) de valores e a “esquizofrenia” da nossa sociedade moderna.  

A Morte de Ivan Ilitch é uma autobiografia de Leon Tolstoi, famoso por levar uma vida desregrada com jogos, bebidas, prostitutas. Desregramento apenas contido pela sua busca espiritual, porém uma fé constantemente abalada por crises existenciais ao longo de sua vida. O próprio Tolstoi dizia: “não passei um dia em minha vida sem pensar na morte”.

Estamos falando de uma obra universal, pois suas inquietações e angústias pertencem à vida de qualquer um de nós, independentemente da época. Por isso ela chega a ser obrigatória (a meu ver) por nos ajudar a refletir sobre a frágil condição humana diante da nossa finitude.

Nas suas breves páginas, Tolstoi brinda o leitor com o relato de um acerto de contas, revelando a futilidade do modelo de vida burguês. As preocupações corriqueiras, os afazeres mundanos impediram-no de pensar nela. Será preso ao leito, frente à morte certa, que a vida de Ivan Ilitch se revelará mais livre, mais autêntica e vigorosa.  

Absorto num sofrimento desesperado, Ivan Ilitch se dá conta da insignificância de sua vida, da fragilidade de suas conquistas. Apesar de suas dores físicas serem terríveis, o que mais lhe doía era a sua consciência moral. Diante da finitude, a ânsia de encontrar propósito para sua breve (e vulgar) existência era imperativa!  “Vulnerável, clamava por carinho, piedade e, em silêncio, nutria um desejo inconfessável para um homem de respeito: queria ser cuidado como se fosse uma criança”.

Buscar e encontrar o significado da vida é algo particular. O juiz Ivan Ilitch foi um homem que não atentou para a liberdade de poder escolher seu destino.  Mas, no momento em que ele adota uma atitude em relação ao sofrimento, algo fenomenal o liberta. Ah, a morte: “Que alegria!” Ivan Ilitch recebe-a de braços abertos!


(* A primeira vez que li foi por recomendação de Mauro logo quando fui ensinar no Laboratório de Comunicação da FPS há alguns anos. A segunda foi após ter encontrado um sentido para a minha vida)




quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Humano, demasiadamente humano!


Tudo bem, isso não é novidade, mas não custa nada lembrar algumas das atribuições que nos fazem uma pessoa melhor. Praticar a escuta se tornou para mim um mantra nos últimos anos. Entende-se aqui por: abrir o coração, livrar-se de preconceitos, não impor conhecimentos, aceitar a diversidade, evitar julgamentos em função de impressões, não ignorar o outro e, sobretudo, respeitar as verdades de cada um. Mesmo que isso gere uma discussão daquelas! Nada que uma cerveja não dissolva qualquer mal-estar.

Sempre quando passava sobre o viaduto Joana Bezerra me perguntava como era a vida na comunidade mais estigmatizada do Recife. Não é possível que só haja marginal ali! Recentemente, tive a grata surpresa (ou melhor, privilégio) de ver, em primeira mão, o livro Senhoras do Coque, produzido pela Rede Coque Vive, da qual faz parte uma querida colega de mestrado, Rafa, que me acompanha desde quando éramos apenas alunas especiais em busca de uma vaga no concorrido mestrado de Sociologia.   

O livro traduz exatamente o meu entendimento sobre o que é uma escuta aberta. Nele, são contadas de forma bastante singela – como a vida dessas criaturas - as histórias de Dona Paulina, Dona Zezé, Dona Valda, Dona Luiza e Dona Geralda. São relatos de amizade, de valores, de alegria, de sofrimento e de fé. Sem dúvida, há vida em abundância dentro do Coque, e não meras estatísticas. Aquela comunidade pulsa e nós a maltratamos demais.

A narrativa do livro é bastante comovente. Comove pela simplicidade do texto e pelo respeito em preservar a fala do entrevistado, deixando-o extremamente original.  Nele, adentramos na vida como ela é daquelas pessoas que sofrem, amam, perdem – no sentido mais cruel do termo -, choram e se divertem com as coisas mais simples do mundo! Pessoas como nós, pessoas desprezadas por nós! Em Senhoras do Coque, tudo é simples, tudo é singelo, tudo é humano, demasiado humano (Niezstche).

Parabéns aos que fazem parte deste lindo projeto. Parabéns a Rede Coque Vive, parabéns a Chico Ludemir, a Maria Liberal, a Rafaela Vasconcellos e a Sandokan Xavier.Aqui vai também o meu parabéns especial ao Frei Aloísio Fragoso que, apesar de não estar diretamente no livro, levou-me através de duas missas a conhecer mais de perto e ajudar a comunidade do Coque.

Uma salva de palmas para as Senhoras do Coque! E todos os que fazem parte dela, sem dúvida, um dia agradecerão pela dignidade que essa moçada da Rede Coque Vive está devolvendo para a Comunidade, com C maiúsculo mesmo!

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

The British Style II – Persuasão


Simplesmente adoro os filmes ingleses de época, sobretudo aqueles baseados nos romances de Jane Austen, tão ricos em sentimentos. Recentemente, assisti ao delicado Persuasão. Absolutamente encantador! Só para lembrar que os ótimos filmes Orgulho e Preconceito e Razão e Sensibilidade são inspirados nos livros de Austen. Através da sua escrita, a autora critica com maestria (e ironia) o comportamento conservador da época.

Jane Austen dispensa recomendações. Persuasão é uma linda história de amor inicialmente intensa, depois totalmente desprezada e, por fim, sucumbida até chegar à redenção. Apesar de soar clichê, a intensidade de seus personagens e a crítica aos padrões morais da época afastam qualquer ideia de lugar-comum, mesmo a história e os personagens nos parecendo tão familiares.

O enredo gira em torno dos amores de Anne Elliot que se apaixonara pelo pobre, mas ambicioso jovem oficial da marinha, capitão Frederick Wentworth. A família de Anne não concorda com essa relação e a convence romper seu relacionamento amoroso. Muitos anos depois, quando sua família entra em bancarrota total, Anne reencontra Frederick, agora cortejando a sua amiga e vizinha, Louisa.

Persuasão é uma simpática história de amor, de trama simples e bem elaborada, e mostra o estilo de narrativa irônica de Jane Austen. Além disto, é original pelo fato de ser uma das poucas histórias da escritora que não apresenta a heroína em plena juventude. A história é situada em Bath, um balneário romano termal ao norte de Londres, onde Jane Austen viveu entre 1801 e 1805 e onde eu e minha irmã Mamá quase congelamos na neve em plena praça, durante um rigoroso inverno inglês de janeiro de 2001. De fato, um belo cenário inglês! Lovely!



quinta-feira, 29 de setembro de 2011

É com esse que eu vou...



A gente não pode reclamar dos talentos da nossa música brasileira. Apesar de ter aparecido em diferentes momentos muita gente talentosa, nunca existiu artista que superasse a eterna diva Elis Regina. Meu Deus, como ela canta com a alma! Aliás, adoro as pessoas - comuns, célebres, anônimas - que colocam a paixão em tudo que fazem. 

Sou do time que defende essa bandeira, mesmo quando se está escrevendo uma tese de doutorado ou vendendo um produto. E é por conta dessa paixão que hoje esse post é dedicado à Elis Regina. Ah, só para deixar registrada uma feliz coincidência: Elis nasceu no dia 17 de março, a mesma data desta que vos escreve.  

Conhecida por sua presença de espírito e pela personalidade forte, Elis teve de enfrentar muito preconceito ao longo dos seus 36 anos vividos intensamente. Elis pagou um preço alto demais por querer ser ela mesma. Uma mulher inteira e intensa em tudo o que fazia. Verdadeira e controversa. Ela costumava dizer que cantar era um sacerdócio, o resto era resto. Nós, fãs, percebemos isso na força de sua interpretação.  

Não tem nada parecido com Atrás da Porta. E quando ela canta Arrastão num daqueles festivais? Sem falar nas É com esse que eu vou, Só tinha de ser com você (uma das minhas preferidas), Falso Brilhante, Fascinação, O Rancho da Goiabada, o Trem Azul, Águas de Março, com o Maestro Brasileiro. Vou parar por aqui porque a lista é grande demais!

Quando Elis morreu, em 1982, eu tinha apenas 10 anos, mas lembro perfeitamente a cena da minha mãe chorando copiosamente em frente à televisão ao ver o noticiário, como se Elis fosse da família. Essa cena nunca saiu da minha cabeça. Pelo contrário, a partir dela, minha paixão por Elis aumenta, aumenta, aumenta e atravessa gerações. Minha filhota Júlia, 5 anos, adora Águas de Março!

Para quem quiser relembrar Elis Regina, recomendo o excelente livro Elis, um furacão, escrito pela jornalista Regina Echeverria. Uma biografia maravilhosa que, segundo a autora, é um contraponto à tendência de canonizar figuras polêmicas. Nele, a gente conhece de fato a verdadeira Elis, com seus arroubos, paixões, virtudes e defeitos. “Este livro é a expressão plena da humanidade de Elis Regina Carvalho Costa”, resume Echeverria, amiga da cantora. 


Também recomendo essa maravilhosa caixa com 3 DVDs (Esse foi mais um daqueles presentes arrasa-quarteirão do meu amado Mauro). Tem Elis em diferentes momentos. Tem Elis com Adoniram Barbosa, Elis ao lado de Tom Jobim, sozinha, em festivais. É uma compilação maravilhosa daquelas obrigatórias de se ter em casa.

"Me tomam por quem? Um imbecil? Sou algo que se molda do jeitinho que se quer? Isso é o que todos queriam, na realidade. Mas não vão conseguir, porque quando descobrirem que estou verde já estarei amarela. Eu sou do contra. Sou a Elis Regina do Carvalho Costa que poucas pessoas vão morrer conhecendo".

Elis, para sempre Elis!

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

The british style...


Ultimamente os ingleses estão em altíssima lá em casa. Já falei em algum post desses que eu tenho uma relação bipolar com Paris e Londres. Pelo que vocês vão ler hoje, o meu humor e amor pendem para o refinado The english style. E olhe que tenho uma certa propriedade quando o assunto é Londres!

Ao longo de várias gerações, a Inglaterra se destaca nas artes, na música, na moda, na vanguarda e na literatura. Eu só deixaria a culinária do lado de fora dessa lista, embora hoje eles torçam o nariz com essa afirmação. Ok! Há alguns pratos típicos legais, mas longe de ser uma referência gastronômica, apesar de os chefs midiáticos terem elevado o status da cozinha inglesa. Não posso falar de Londres sem ao menos citar o meu adorado “Hero” David Bowie e o refinado Oscar Wilde (tudo bem, o poeta era irlandês, mas passou a vida na sua Londres querida). Mas, para não me prolongar muito, ficarei apenas no cinema.

Ultimamente tenho visto ótimos filmes britânicos. Quando vou a uma locadora, utilizo alguns critérios de escolha quando não sei ao certo o que pegar, como premiados, europeus e cult. Mas, o critério de incluir filme britânico numa alta categoria tem dado muito certo. Mesmo sendo uma produção recente, de 2008, nunca tinha ouvido falar no filme A Vida num só dia. Utilizando-me dos requisitos acima expostos, arrisquei. E valeu a pena! Sobretudo numa sexta-feira chuvosa, regada a um bom vinho com meu maridão ao lado. (As feministas me desculpem, mas ter marido é legal!)

A Vida num só dia é uma bela história dentro de uma charmosa produção. E, antes de tudo, despretensiosa! Talvez esse seja o maior atributo do filme, que começa com uma elegante trilha sonora. A primeira cena, bem peculiar, mostra a Miss Pettigrew (o nome dela é o título original do filme), uma governanta sendo despedida pela enésima vez depois de 20 anos trabalhando para a mesma família.

Estamos falando de uma Londres efervescente culturalmente na década de 40. Após roubar uma indicação de sua agência de emprego, Miss Pettigrew assina para trabalhar com a Srta. Lafosse, jovem oportunista que se relaciona com três homens, sendo dois por interesse e um por amor. E o dia em que passam juntas vai transformar as suas vidas para sempre.

A bela fotografia de John DeBorman, ao som de ótimas canções da época, nos leva a uma Londres nostálgica e, talvez por isso, ainda mais charmosa. O figurino é demais. E logo eu que adoro um look retrô! A alegria do filme é contagiante justamente por sua energia, música e ótima condução. Sim, é comédia. Sim, é romance. E sim, o final é clichê. E talvez por isso seja um ótimo programa para casais. Não, não apenas para casais, not at all! Reformulando. Talvez por isso seja um ótimo programa para os que querem celebrar a vida, apreciando o que ela tem de melhor a nos oferecer!

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Chutando tampinhas...


Foi meu primo Lito Cavalcanti quem me deu o primeiro livro de João Antônio assim que eu cheguei de mala e cuia em São Paulo, em meados de 90. Nunca tinha ouvido falar nesse escritor ate então. Fui logo atraída pelo sugestivo título, Dedo-duro, e sugada pela narrativa do escritor. Fiquei apaixonada e me perguntando como eu não conhecia João Antônio de outrora. Para piorar, ainda não existia o google, parceiro de todas as horas, e os sites de busca eram bem fracos.

Fui correndo à Livraria Cultura do Conjunto Nacional e pasmem! Nada. Nenhum livro dele nas prateleiras da livraria mais cool de São Paulo na época. Como pode? Começou minha busca quase desesperada (logo transformada numa obsessão) por um exemplar de João Antônio nas livrarias. Rien! Restavam-me os sebos. Aliás, diga-se de passagem, adoro a cultura de sebo, essa circulação de livros, de histórias e de saberes.

Ali começava minha peregrinação pelos maravilhosos sebos de São Paulo e, após muita procura, encontrei um exemplar bem velhinho de Malagueta, Perus e Bacanaço. Pronto. Fui definitivamente flechada pela escrita de João Antonio. Uma paixão logo transformada em indignação. Como é possível? Não há livros dele, quase ninguém o conhece.

Estava completamente órfã, sem ter com quem dividir as peripécias do chutador de tampinhas, até que um belo domingo fui surpreendida com a ótima coluna Macho, através da qual Xico Sá declarava seu amor incondicional ao porta-voz dos bêbados, das prostitutas, dos sinuqueiros e afins. Acho que a falta de interesse das grandes editoras por João Antônio se dava pelo fato do cronista contrariar a lógica dominante.

Na década de 60, após ganhar dois prêmios “jabutis” e trabalhar em importantes jornais e revistas, João Antônio largou o seu emprego, destruiu seus cartões de crédito, vendeu seu carro e se separou da mulher. Enfim, adotou um estilo de vida próximo da marginalidade vivida por seus personagens para se dedicar inteiramente à literatura.

Os críticos viam-no como uma espécie de Lima Barreto do fim do século XX. Era  preciso mergulhar na genialidade, fraqueza, cultura, solidão, ressentimento, contradição, mulatice e vaidade que ambos comungavam. Finalmente foi lhe dado o devido lugar à literatura. A edição de luxo da Cosac Naify com vários livros de João Antônio é uma obra-prima para ler e guardar na estante em lugar privilegiado.

João Antônio é um escritor da marginalidade, o nosso Bukowski, o intérprete do submundo que se manteve fiel ao seu estilo literário até o fim. Seu corpo estirado na cama em seu muquifo alugado em Copacabana só foi descoberto 15 dias após sua morte, em 1996.  Em vida, encarava a solidão com escárnio, adjetivando-a de nojenta mais para aliviar a si mesmo do que por reclamação. Grande, João Antônio!

Querem ser fisgados de cara por ele?  Comecem com Perus, malagueta e bacanaço.

sábado, 10 de setembro de 2011

Mais do que um mimo…


É muito bacana essa concepção da Mimo, a Mostra Internacional de Música em Olinda.  Além dos shows mais modernos ao ar livre (como o Gotan Project), assistir a concertos dentro de belas igrejas é uma das sensações das mais agradáveis e emocionantes. A execução de músicas clássicas nos envolve numa atmosfera ritualística que nos aproxima do sagrado. É de um simbolismo gigantesco. O critério de seleção das atrações impressiona pela qualidade.

Não é novidade que esse duo de música clássica e igreja é uma fórmula muito usada na Europa. Mas, as apresentações e concertos em igrejas por aqui só começaram após o aparecimento da Mimo. A gente agradece!

Pezão resumiu num post o sentido deste evento quando atribuiu (e agradeceu) à produção o fato de ter conhecido a Capela Dourada só agora, apesar de ser daqui e dos seus 40 e alguns anos. Foi uma unanimidade a apresentação do minimalista Philip Glass na Igreja da Sé. A lotação nos locais só revela o óbvio: como nós pernambucanos somos carentes de programações culturais bacanas. Quando acontece um evento como este é sucesso na certa! E consolidado!

Outra coisa muito legal desta edição foi a Mostra ter cruzado a fronteira de Olinda e invadido a cidade do Recife (E João Pessoa também). Fui ao concerto da Orquestra de Câmara de Toulouse na Igreja do Carmo. Que cena mais bonita a igreja tomada por gente de todas as classes sociais, todos reunidos ali com um único propósito: apreciar o belo! Músicos de excelência (esta característica Mauro sabe reconhecer melhor do que eu por ser músico nas horas vagas) executando lindas peças!

Sem dúvida, a Mimo é muito mais do que um mimo para nós pernambucanos. É uma dádiva!

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Até as princesas soltam pum…



Eu sempre me incomodei com as histórias de princesas, sempre belas, magras e loiras. Alguém já viu uma princesa negra ou gorda? E baixinha? Se alguém souber, por favor, me avise porque eu nunca vi. A gente cresce tendo em mente esses padrões de beleza para sonhar e se projetar. Imagine quando a criança é gordinha, dentuça e/ou usa óculos? Ou quando o cabelo é pixaim?  A bailarina de Chico também não tem lombriga, nem frieira, nem piolho, nem ameba e nem pereba.

Sem dúvida, a busca de um ideal que não existe começa logo na infância. Haja frustração por não corresponder aos modelos de formosura dos contos de fadas e das bailarinas. E, na vida adulta recorremos à terapia (seja ela no divã ou na mesa de um bar) para aprendermos a lidar com as nossas “imperfeições”. Isso é desumano!

Por ter sentido na pele o que significa não ser a mais alta, nem a mais loira da classe (para ficar só aqui), sempre procurei desviar a atenção da minha filha Júlia, de quase seis anos, desses valores bestas. Desde bem pequena, ela ganha bonecas do tipo sarará e gorducha. Uma das preferidas é Uva com todas as características acima.

No ano passado, vi um livro que me chamou muito a atenção, na Livraria da Vila, em São Paulo. O título já aguçou a minha curiosidade e, após folheá-lo, não pensei duas vezes. Até as princesas soltam pum conta a história de Laura, uma garota muito curiosa. Uma das questões que mais a intriga (e a seus colegas de escola também) é saber se as princesas soltam ou não pum.

Ela recorre ao pai para esclarecer a dúvida tão perturbadora, que, por sua vez, apela para o antigo "livro secreto das princesas" e, com ele, a confirmação "sim, Cinderela, Branca de Neve e até a Pequena Sereia sempre soltaram pum!". Mas, isso não é tudo, sabe por que o caixão de acrílico de Branca de Neve não podia ficar aberto? E por que o príncipe se apaixonou por ela? E como a Cinderela soltou seu primeiro pum? Bem, descubram o segredo!

domingo, 28 de agosto de 2011

Ainda dá tempo de ir....




Quem ainda não foi, ainda dá tempo de correr para assistir no cinema ao inesquecível  A Árvore da Vida. A começar que é um filme fora dos padrões. Talvez isso explique o incômodo gerado em algumas pessoas que, logo no começo da projeção, saíram da sala em debandada. É um filme transcendente.Que aborda as questões da vida humana, com todas as nossas contradições, dúvidas e beleza. É arrebatador, de uma densidade sufocante, assim como é a vida. Tudo nesse filme é superlativo!

A partir de uma história ambientada na década de 50, nos Estados Unidos, o filme atrela a vida de uma família - com suas perdas, mediocridades, frustrações e fraquezas - com a grandeza do universo, desde a sua criação. A fotografia é bela, assim como a trilha sonora. O tempo é o personagem principal do enredo através do qual o passado e o futuro se confundem.

Perdas, dúvidas religiosas, conflitos familiares, finitude humana. Aqui, todas as questões da dimensão humana são tratadas profundamente, embora com pouquíssimos diálogos. É um filme para ser visto. A mim me tocou profundamente. Chorei do começo ao fim. “A menos que ame, a sua vida passará rapidamente”!



quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Só garotos...



A primeira vez que ouvi falar deste livro foi após ler, através do Facebook, a recomendação entusiasmadíssima de Xico Sá (Ali sabe das coisas!). Foi um dos melhores livros já lidos por mim nos últimos tempos. Que leitura comovente! De uma verdade tão crua que nos remete ao estilo rodrigueano de a vida como ela é.   

Só garotos é uma autobiografia cativante escrita pela artista Patti Smith, que revive sua história ao lado do fotógrafo Robert Mapplethorpe, enquanto os dois tentavam ser artistas e transformar seus impulsos destrutivos em trabalhos criativos. Eram jovens que se amavam, passavam fome juntos e não podiam viver separados. O relato de Patti traça a metamorfose pessoal e artística do casal.

Nascida numa família pobre de Nova Jersey, Patti Lee se muda para Nova York aos 20 anos, após entregar seu filho para adoção. Ela parte em busca da arte, na década de 60, e vivencia de perto o auge da contracultura norte-americana. Leitora de Rousseau e devota da poesia transgressiva de Arthur Rimbaud e dos beatniks Allen Ginsberg e Jack Kerouac, Patti Smith, de 64 anos, é uma intelectual do rock.

Mapplethorpe ficou famoso por seus retratos nada convencionais. Sua principal modelo foi Patti Lee: de  terno, hippie, coberta com lençol indiano, etc. - o que importava era registrar a essência por trás daqueles trajes. Só garotos mostra a trajetória de dois talentosos artistas em busca da arte e da liberdade. Dois jovens artistas que, em nome da estética e da vanguarda, apostaram na ousadia para impor uma arte vigorosa em oposição ao mundo massificado da indústria cultural.

O livro é verdadeiro desde a primeira linha quando ela diz: “Tem gente que nasce rebelde”. É comovente pela sinceridade destemida da artista, que revela suas fragilidades com uma coragem arrebatadora. Nele, não há julgamento de ideias, nem de atitudes. É um livro que fala de amizade, lealdade e cumplicidade, de uma forma tão nobre e intensa que nos leva às lágrimas! De tirar o fôlego, no sentido mais literal do termo!

domingo, 21 de agosto de 2011

Mulher nova, bonita e carinhosa...


Passei tanto tempo sem escutar que eu tinha até esquecido como é bom o trabalho dessas três cantoras maravilhosas. O projeto Três Meninas do Brasil foi uma daquelas ótimas surpresas descobertas bem por acaso quando comprava um CD para dar de presente de aniversário. Não resisti ao escutar “mulher nova, bonita e carinhosa, faz o homem gemer sem sentir dor...” Amo, amo, amo! Quem quiser que não ache, mas Zé Ramalho é um talento!

Fiquei mais doida quando ouvi: “Numa tarde linda, eu me lembro ainda, do velho cais dourado, sambando, esquirondo, eu vi a moreninha, esquirondo, batendo as tamanquinhas, esquirondo, e eu maravilhado...” Vixe, a cara da minha infância ainda por cima!

Acho o projeto Três Meninas do Brasil bacana por mostrar a diversidade da música brasileira, além de unir três ótimas intérpretes, de diferentes regiões: a maranhense Rita Ribeiro, a carioca Teresa Cristina e Jussara Silveira, que é mezzo baiana, mezzo mineira. As músicas de Marisa Monte e Zeca Baleiro convivem harmonicamente com canções de Dorival Caymmi e Paulinho da Viola.

A viagem passa por Moraes Moreira (Meninas do Brasil), Tom Zé (Menina Amanhã de Manhã), Sérgio Sampaio (Maiúsculo), Caetano Veloso (Nu Com a Minha Música e Dama do Cassino), Chico Buarque (Ludo Real), Carlinhos Brown (Seo Zé), Dominguinhos (Isso Aqui Tá Bom Demais) e até mesmo o praticamente esquecido Márcio Greyck (Impossível Acreditar Que Perdi Você). Elas ainda resgataram a linda Chula Cortada, de Roque Ferreira!

A direção musical é de Jaime Amorim, maestro de Maria Bethânia há mais de 20 anos. O CD e DVD, lançado pelo Biscoito Fino, é resultado de um show realizado em Niterói em 2008. É para escutar sem parar!

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Os dominós de Patrício



Fiquei simplesmente maravilhada quando vi pela primeira vez a obra de José Patrício no Mamam. Era uma instalação enorme de dominós de plásticos que formavam no piso um belo mosaico colorido. No texto de abertura, o então curador Moacir dos Anjos falava da metáfora utilizada pelo artista ao impor a rigidez do jogo, que apesar de suas regras fixas, organizava-se em vários movimentos. De fato, impressionante!

Muitos anos depois reencontrei sua arte na galeria Mariana Moura quando fazia assessoria de imprensa de lá. Aliás, a dona e o espaço são ótimos! A exposição Vuco-Vuco trazia uma série de combinações de jogos feitos a partir de diversas peças de dominós, pregos e botões garimpados nos arredores do Mercado de São José - mais conhecido como vuco-vuco. O artista ainda fazia um experimento com o acrílico na base para a colocação dos jogos de dominós. Como suporte, havia a exibição de um vídeo com o registro de todo o processo de criação dele.

A partir dali, passei a sonhar com um quadro de José Patrício na minha casa, daqueles bem grandes. Enquanto o sonho não se concretiza, estou feliz com os meus dois pequenos jogos pendurados cuidadosamente e carinhosamente numa pequena, mas destacada, parede da minha casa. São minhas pequenas “grandes” obras!

José Patrício é hoje um dos artistas plásticos mais valorizados nacionalmente, com uma aceitação muito boa no mercado internacional. Sua obra se caracteriza pela ambiguidade; subjetividade e objetividade, acaso e precisão são dicotomias presentes em sua arte. As instalações de Patrício com os dominós podem ser vistas sob a perspectiva formal ou conceitual. Depende do olhar de cada um. Isso que é muito bacana! O artista cria bonitas composições, às vezes com efeitos óticos, valendo-se das configurações estabelecidas pelos pontos nas pedras, pelas diferentes cores e materiais das mesmas, e pela estrutura serial.

Recentemente foi lançado o livro José Patrício: Cogitações sobre o Número, organizado pelo curador e crítico de arte carioca Paulo Herkenhoff. O livro aborda o trabalho da arte visual deste artista pernambucano diante da materialidade do signo numérico, através de objetos lúdicos e do nosso cotidiano. Recomendo! Ele está à venda na Livraria Cultura, por R$ 95,00.


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Um gênio chamado Cole Porter!


Eu tenho um fascínio pela vida deste compositor norte-americano que não é brincadeira. Aliás, eu e a torcida do Flamengo! Nunca conheci uma pessoa para me dizer que não curte Cole Porter. Mesmo os que não o conhecem tão bem, gostam de suas canções na voz de outros artistas famosos. Frank Sinatra popularizou Night and Day e Diane Krall fez muito sucesso com I've Got You Under My Skin.

Além da fama que alcançou por conta do talento – suas músicas são de uma sofisticação ímpar -, Cole Porter gerou muita controvérsia na vida pessoal. Bon vivant nato, seu gosto pelo luxo e pela extravagância fez dele um dos nomes mais glamourosos de todos os tempos.

Porter era homossexual assumido, mas casou com a viúva de um banqueiro, Linda Lee Thomas, com quem viveu por mais de vinte anos entre Paris e Nova York. Só a morte dela foi capaz de separar um dos casais mais badalados e polêmicos da década de 30, apesar dos altos e baixos da relação. Boêmio e muito cobiçado, Cole Porter convivia entre o luxo e a fama, além dos muitos prazeres com os garotos da época.

Era uma época de muita efervescência. Era do Jazz, de Coco Chanel, de Pablo Picasso, de Ernest Hemingway. Após sofrer um acidente, Cole Porter teve sérios problemas de saúde. Apesar da fama e do glamour, um dos compositores americanos mais populares morreu na mais completa solidão e alcoólatra. Uma injustiça! 

Algumas de suas músicas foram imortalizadas no cinema e na Broadway. Ele compôs mais de 500 canções, dentre as quais 100 foram eternizadas pelo cinema.  Sua música popular ficou famosa na voz de diversos interpretes, um dos mais famosos, Frank Sinatra.

Vale a pena pegar na locadora o filme De Lovely, uma biografia deste famoso compositor. Caetano Veloso interpreta lindamente So in Love, um de seus maiores sucessos, no ótimo Foreign Sound.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

C'est pour moi!

A primeira vez que assisti ao Fabuloso Destino de Amélie Poulain foi num lugar nada menos chamado Notting Hill quando morava na minha amada Londres. Como a história daquela simpática garota de Montmartre me tocou! Ali recomeçava o meu caso de amor eterno - aparentemente esquecido - com a França! Paris é um daqueles lugares que não cansa nunca. Vários amigos já compartilharam comigo o sentimento de se emocionar ao pisar em Paris, mesmo não sendo a primeira vez.

Voltando à garota da charmosa Montmartre, quanta sutileza! Afinal de contas quem não tem um pouco de Amélie? Quem não cria para si uma fábula tão apaixonante e uma visão otimista da vida? A direção de arte é primorosa, Audrey Tatou está perfeita no papel e a comovente trilha sonora dá um charme todo especial a este filme , que nos leva a um sentimento de nostalgia e leveza. Um filme que comove e apaixona!

Composta por Yann Tiersen, as músicas dão o tom do filme. Se tivesse de escolher uma trilha sonora da minha vida, esta teria fortes possibilidades de ganhar o posto. E ainda por cima, o meu primeiro presente de Natal do meu então namorado (que hoje se tornou meu companheiro de todas as horas) foi o CD de Amélie Poulain. Luxo e riqueza!

Além deste filme, Yann Tiersen também assinou a ótima trilha sonora do filme Adeus, Lênin! Nascido na Bélgica – e radicado na Franca, este jovem compositor de 42 anos é considerado um músico de vanguarda e minimalista. Ele é multi: toca piano, sanfona e violino. E ainda compõe para o teatro. Voilà! Cette bande originale n’est pas pour elle, Amélie. Elle est pour moi!

Bon week-end et à lundi, mes amis!


quarta-feira, 10 de agosto de 2011

um filme sobre o belo!



Li essa novela de Thomas Mann há uns 10 anos. Como amo tudo - pelo menos os livros que eu li - deste grande escritor alemão, adorei! É uma obra densa. Recentemente, cansada das programações Déjà vu daqui de Recife, sugeri a meu marido (que topou prontamente!) irmos a uma sessão do cineclube Cinema & Psicanálise, sábado à tarde no auditório da Academia Pernambucana de Medicina. Seria exibido o filme Morte em Veneza, nunca visto antes por esta que vos escreve, seguido de um debate com ninguém menos que Alexandre Figueirôa.

Figura super cult desde os meus tempos de Católica, Figueirôa é crítico de cinema, jornalista (atualmente coordena o curso de jornalismo da Unicap) e recentemente - li numa revista - adotou uma invejável eco e bacana way of life em Vila Velha. Não disse no começo deste parágrafo que Figueirôa era cool?

Voltando à sessão do Cine & Psiquê, foi uma das tardes de sábados das mais agradáveis. Ao contrário do que acontece normalmente, o filme não é menor do que o livro. Após a exibição, assistimos a uma ótima discussão sobre Morte em Veneza, do italiano Luchino Visconti. Os comentários a seguir são frutos do que vi e ouvi nessa sessão especial.

O compositor Gustave, personagem principal, viaja para Veneza em busca de paz diante de uma crise existencial. Ao chegar à cidade, adoece. Ao colapsar também com seu processo de criação, ele passa a refletir sobre a finitude da vida. A cena da ampulheta sugere uma parábola sobre a existência humana. Parênteses: Na narrativa de Mann, o personagem central é um escritor, mas Visconti o transforma em músico.  

O filme não sugere apenas uma reflexão sobre a nossa transitoriedade, mas nos leva a pensar também sobre a dissolução da capacidade criativa do sujeito. Gustave é o arquétipo de um ideal de cultura europeia, do final do século XIX, que se dilui. São os indícios dessa tal modernidade. E, como diz o badalado sociólogo Zygmunt Bauman: “A modernidade é líquida”!

Ao som de violinos e pianos, ele tem seu primeiro contato no salão do hotel com Tadzio, ou melhor, com a beleza em sua forma idealizada. Mas, afinal, o que é a beleza? Um sentido do homem ou uma dimensão espiritual? O contato com Tadzio atiça em Gustave diversas reflexões sobre o belo, a arte e o papel do artista. São metáforas que não podem ser ignoradas e ajudam na apreensão do filme.

O fascínio de Gustave pelo jovem só cresce no decorrer de Morte e Veneza, assim como a sua angústia. A sensação de  prazer se mistura a de desespero. Como o compositor é um moralista nato, típico de seu tempo, nada pode modificar a sua compreensão acerca do belo, que é intocável. Mas, quando filtrado pelos nossos sentidos, o belo é maculado!

A busca pelo sublime se contrasta a uma praga que ataca Veneza, trazendo à tona a decadência e a miséria. É difícil imaginar uma Veneza feia, hein! Mas Visconti consegue mostrar exatamente o contrário dos nossos ideais estéticos da beleza.

Ao perceber a eminência da morte, Gustave se dissolve assim como a cidade tomada pela peste. A cena final na praia deserta nos transporta à última etapa do amor platônico de Gustave por Tadzio, representado ali por um Deus grego da mitologia. A ambivalência se faz presente no filme: a morte que o aprisiona é, ao mesmo tempo, a que vai libertá-lo!

Belo filme!


segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A cabidela, eu e o cinema!


Comer é um dos maiores prazeres da minha vida. Não entendo quem não dá valor ao ato de comer. Ultimamente tenho apreciado bastante uma comida caseira, sobretudo os hábitos alimentares do interior. Só de lembrar da galinha de cabidela que Saboga (um cozinheiro do meu eterno Manso querido) preparava, minha boca já enche de água. Literalmente! Aliás, essa mania (ou melhor, característica) vem de outrora; parece que o meu filho João Francisco, de dois anos, está caminhando nessa mesma direção.

Não sei que danado de tempero o pessoal coloca no interior que o sabor fica diferente. E nostálgico! Acho que nos remete a um passado bem distante. Como é gostosa uma galinha de cabidela bem preparada! Para os que não sabem, a cabidela é o molho à base de sangue da ave. Dizem que o poulet en barbouille, como o nome indica, surgiu na França. Voilà!  Mas, há controvérsias. Em Portugal, há a famosa galinha de cabidela do Alentejo. Eça de Queiroz cita essa iguaria diversas vezes em seus romances.

Independentemente da sua origem, sem dúvida, comer é muito mais do que saciar a fome. Além do ritual que envolve o preparo dos pratos, o simbolismo em torno das refeições é muito forte. Que o diga Gilberto Freyre! E a sociologia da gastronomia, que anda tão em voga. Se a gente parar para pensar, boa parte das coisas boas (e ruins também!) da vida acontece quando estamos reunidos em torno de alguma refeição.

A culinária vem sendo aprimorada ao longo dos anos. E cozinhar se tornou uma arte cada vez mais sofisticada que o cinema soube captar muito bem. Isso me faz lembrar um dos filmes mais deliciosos, poéticos e delicados que já vi: Comer, beber e viver, de Ang Lee. Um pai e suas três filhas se reúnem uma vez por semana em torno de belas refeições. A comida é pano de fundo desses encontros e desencontros, amores e desilusões. Tudo isso posto à mesa sempre aos domingos. Ang Lee em sua melhor forma!


Recomendo demais!

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Baudelaire e as ruas de Paris


Eu tinha acabado de ser aceita pelo ótimo professor Jonatas Ferreira como aluna especial no programa da pós-graduação de Sociologia da UFPE (aliás, se hoje estou fazendo o mestrado, Jonatas tem sua parcela de contribuição), e logo na primeira aula nos foi apresentado o programa da disciplina de Modernidade e Pós-Modernidade.

Foram quase seis meses de discussões riquíssimas sobre estética, vanguarda, romantismo, expressionismo alemão, escola de Frankfurt e afins, embora muitas vezes eu saía da aula com vontade de abandonar e desistir de tudo. Não vou conseguir! Esse pensamento se tornou um mantra no meu juízo! Mas, os temas eram instigantes demais e assim fui indo.

O segundo seminário era sobre Baudelaire e a modernidade. Jonatas olhou pra mim com aquele jeito meio de brabo (que medo!), apontou, e disse: você faz esse seminário! Putz, me ferrei! Apesar de badalado e de todos falarem de Baudelaire com tanta intimidade, eu pouco sabia sobre a vida e obra desse poeta parisiense. Mas, não tinha saída a não ser estudar. No final deu tudo certo e Baudelaire ganhou mais uma fã!

A cidade é tema da lírica moderna de Charles Baudelaire. Assuntos referentes à boêmia, ao flâneur (o vagabundo que perambula pela cidade sem propósito) e à modernidade fizeram parte da poesia urbana desse francês que morreu na pobreza total. Considerado o pai da modernidade, ele coloca em xeque o progresso meditando sobre esse conceito. Mais do que um cânone moderno, Baudelaire é o retrato de uma sociedade em transformação.

Os fenômenos da vida cotidiana da Paris do século XIX são o centro da reflexão das mudanças socioeconômicas ocorridas freneticamente naquele momento. Através de seus personagens (o flâneur, o boêmio, o dândi e o trapeiro), Baudelaire desafia as regras do jogo social.

Sempre que falo em Baudelaire me vem logo à mente o genial João Antonio, com seu Malagueta, Perus e Bacanaço. Eu ainda guardo com muito carinho a minha surrada edição desta obra-prima, adquirida nos velhos sebos da paulicéia. Finalmente ganhou o status que merecia. A Cosac Naify reeditou vários livros dele. Um primor! João Antonio, nego, você merece um post só seu!

A modernidade de Paris



Através de uma pequena análise do poeta francês Charles Baudelaire, podemos entender a cidade moderna como um terreno privilegiado para expressarmos alguns dos elementos que constituem a modernidade. As novas relações sociais que emergiram após as revoluções de 1848 na França demonstraram que a cidade é o locus da civilização moderna, dos seus conflitos e da sua organização social. Foi nela que Baudelaire montou o seu “laboratório”, retirando as suas impressões sobre a realidade social que o cercava, marcando assim o seu período histórico.

A realidade que cercava Baudelaire era a de mudanças na estrutura da sociedade ocidental, nos séculos XIX e XX, com o evidenciamento da vida urbana e com a instauração de uma nova ordem burguesa e capitalista. A industrialização legou à Paris de meados do século XIX um aumento considerável da sua população urbana e, consequentemente, uma intensificação do tráfego.

A reforma urbana de Paris foi pensada como uma solução para os problemas de circulação. Luís Napoleão (1808-1873), que estivera exilado na capital inglesa, presenciou as reformas londrinas e aplicou-as a Paris quando subiu ao trono francês (1852-1870). Georges Haussmann, prefeito de Paris, graças a um mandato imperial de Napoleão III, começara a implantar uma vasta rede de bulevares no coração da velha cidade medieval.

A Paris do Segundo Império no século XIX, em que o poeta viveu, sofreu essas transformações por meio do surgimento de uma vida urbana, da construção de grandes avenidas, mercados, teatros etc, fazendo com que a convivência das pessoas se transferisse de suas casas para as ruas cada vez mais movimentadas da cidade e com que diversas classes sociais se defrontassem num mesmo local. Os novos bulevares permitiram ao tráfico fluir pelo centro da cidade e mover-se em linha reta, de um extremo a outro.